Ao fim de uma década de congelamento das tabelas, em 2020 volta a haver aumentos salariais para a função pública. Mas, a perda acumulada no poder de compra ainda é da ordem dos 10%. Conheça quanto falta recuperar nas várias carreiras da Administração Pública

Os funcionários públicos recebem este ano o primeiro aumento salarial desde 2009. Mas, ao fim de uma década de congelamento das tabelas, a subida de 0,3% para a generalidade dos trabalhadores do Estado - só os vencimentos mais baixos terão aumentos superiores, de 1% - está muito longe de compensar a perda de poder de compra acumulada durante esses anos.

As contas do Expresso indicam que, em termos reais (ou seja, considerando a inflação, para analisar a evolução do poder de compra), mesmo com este aumento, os vencimentos na Administração Pública ficam este ano, em regra, 10,2% abaixo do patamar em que estavam em 2010. E, se a conta for feita em euros, a perda no poder de compra chega aos 647 euros por mês (na remuneração-base, em termos brutos) nos salários mais elevados.

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A análise de várias carreiras e posições remuneratórias na Administração Pública indica que apenas as remunerações mais baixas registam uma perda inferior no poder de compra. Tudo por causa de beneficiarem de um aumento superior este ano.

O incremento de sete euros mensais anunciado pelo Executivo de António Costa para os dois escalões remuneratórios mais baixos significa um aumento de cerca de 1% para estes trabalhadores - que, segundo o Governo, serão cerca de 150 mil.

Em causa estão os funcionários públicos que atualmente se encontrem posicionados entre os níveis 4 e 5 da Tabela Remuneratória Única (TRU), cujos salários vão aumentar para, respetivamente, 642,07 euros e 690,13 euros. Desta forma, a medida abrange sobretudo assistentes operacionais e assistentes técnicos, que estão nas primeiras posições remuneratórias das respetivas carreiras.

Mas, a perda no poder de compra é apenas ligeiramente mitigada. As contas do Expresso indicam que, mesmo assim, em termos reais, o salário base em 2020 dos trabalhadores ans mesmas funções e posições remuneratórias ainda vai estar perto de 10% abaixo do registado em 2010, em termos reais.

Naturalmente, quando a análise é feita em euros, a perda é mais expressiva nas remunerações mais elevadas. É o caso dos médicos no topo da carreira, onde cehga aos 647 euros por mês, traduzindo a maior quebra no vencimento-base, em temros reais, entre as carreiras analisadas pelo Expresso.

Atenção, esta análise incide apenas sobre a remuneração-base em termos brutos, não tendo em conta outros subsídios. E considera apenas o impacto da inflação, não abrangendo outros fatores que penalizaram o valor líquido da remuneração, como o agravamento dos impostos ou o aumento dos descontos para o subsistema de saúde da função pública (ADSE).

Além disso, como as progressões na carreira foram descongeladas a partir de 2018, os funcionários públicos podem ter visto a sua remuneração engordar nos últimos dois anos. Segundo o Governo, cerca de 500 mil trabalhadores já progrediram desde então, para um universo total de cerca de 690 mil postos de trabalho.

Contudo, quem ainda não progrediu contou com zero de aumento. Até agora, em que pela primeira vez desde 2009 há atualização das tabelas.

Esta análise chama a atenção para outro problema: a perda de competitividade da Administração Pública para atrair e reter os melhores profissionais, dada a degradação do poder de compra associado às várias posições remuneratórias de cada carreira. Em áreas onde há forte concorrência do sector privado na captação de talento, caso dos médicos, por exemplo, isto coloca grandes desafios ao Estado.

Sónia M. Lourenço JCarlos Esteves

12.02.2020 Expresso