Governo aberto a ir mais longe no aumento dos salários da função pública

Por agora, o aumento é de sete euros por mês para os salários mais baixos da função pública. Os sindicatos consideram insuficiente. Mas as negociações começaram agora e o Governo aguarda contrapropostas.

O Governo tem margem para aumentar ligeiramente a proposta de aumento nominal extraordinário de sete euros para os salários abaixo dos 700 euros na função pública, pelo que até ao fim do processo negocial os aumentos extra poderão subir, sabe o PÚBLICO.

É nesse sentido que vão as declarações do secretário de Estado da Administração Pública, José Couto, no final da primeira ronda negocial com os sindicatos do sector, que decorreu, esta segunda-feira, em reuniões separadas no Ministério da Modernização do Estado e da Administração Pública.

“O Governo, da mesma forma que não faz propostas não sérias, também não faz simulações de negociação. Portanto, estamos abertos a contrapropostas e a negociação continua”, afirmou o secretário de Estado, José Couto. Sublinhando que a proposta do Governo “consubstancia” os valores que foram considerados possíveis, José Couto, admitiu que os números podem “ter nuances”. E abrindo a porta a negociações, que voltarão a realizar-se nas reuniões marcadas para a próxima segunda-feira, 17 de Fevereiro, frisou: “Vamos esperar pelas contrapropostas e ver até onde podemos ir, se é que podemos ir mais longe do que o que apresentámos.”

A proposta do Governo, divulgada na manhã de segunda-feira pelo PÚBLICO, aumenta os salários mais baixos em cerca de 1%, ou seja, um aumento superior à média geral de 0,3% previstos para toda a função pública. Este aumento reforçado resulta das negociações entre o Governo, o PCP e o BE sobre o Orçamento do Estado para 2020. Os aumentos serão retroactivos ao início de Janeiro, estando previsto que começarão a ser pagos em Março, se entretanto houver acordo.

Nova medida representa um quinto do valor dos aumentos

O aumento adicional proposto esta segunda-feira pelo Governo para os salários mais baixos da função pública representa um acréscimo da despesa de 18 milhões de euros. Este valor é cerca de um quinto do impacto de 87 milhões de euros que o Executivo está, para já, a calcular para a totalidade das medidas de actualização da tabela salarial a realizar este ano.

Num comunicado emitido após o final da ronda de negociações com três estruturas sindicais da função pública, onde o aumento adicional foi apresentado, o Ministério da Administração Pública disse que em 2020 haverá um reforço das despesas com pessoal associado às actualizações salariais de 87 milhões de euros, sendo que, deste valor, 18 milhões se referem à actualização de sete euros nos níveis 4 e 5 da Tabela Remuneratória da Função Pública.

Quando apresentou, no início do ano, a proposta inicial de aumento de 0,3% para todos os funcionários públicos, o Governo referiu-se, através do secretário de Estado do Orçamento, João Leão, a um impacto situado “entre 60 e 70 milhões de euros".

O aumento adicional proposto significa que, nos dois níveis da Tabela Remuneratória Única mais baixos, o 4 e o 5, o aumento vai ser afinal de sete euros, um valor que, em percentagem, significa uma variação ligeiramente acima de 1% para o valor dos salários desses trabalhadores. O Governo diz que há 150 mil funcionários públicos nessa situação.

No total, diz ainda o Governo, as despesas com pessoal são reforçadas em 846 milhões durante o ano de 2020, um aumento de 3,6% face ao ano passado. A grande maioria deste valor corresponde a verbas destinadas a financiar os acréscimos salariais associados a progressões e promoções, que irão representar uma despesa adicional de 527 milhões de euros este ano.

Outra fatia importante, de 120 milhões de euros é relativa à revisão de carreiras e outros direitos e 112 milhões de euros é o reforço de verbas destinado à contratação de novos trabalhadores para a função pública.

Neste cenário, os 87 milhões de euros do total das actualizações da tabela salarial propostos até agora, e em particular, os 18 milhões de euros referentes à actualização adicional para os salários mais baixos, têm um peso relativamente pequeno.

Níveis 4 e 5

Os aumentos extraordinários acima dos 0,3% previstos para toda a função pública em 2020 aplicam-se aos dois primeiros níveis da tabela remuneratória da função pública, o quarto e o quinto. O salário mais baixo da função pública, do nível 4, é actualmente de 635,07 e passará com este aumento para 642,07. O aumento atinge, neste caso, a primeira e a segunda posição dos assistentes operacionais. No nível seguinte, o 5, dos assistentes técnicos, são abrangidos os funcionários da primeira posição. Estes ganham actualmente 683,13 euros e passam para 690,13 euros, de acordo com esta proposta.

Segundo as informações recolhidas pelo PÚBLICO, os trabalhadores não serão prejudicados no IRS pelo aumento salarial, aliás, haverá parte que é beneficiado. No caso dos assistentes operacionais da primeira e da segunda posição, o aumento salarial não provocará subidas de escalão de IRS e continuarão abrangidos pela isenção. Quanto aos assistentes técnicos, que em 2019 descontavam 4,4%, mantêm-se no terceiro escalão do IRS, mas terão uma redução da taxa de retenção na fonte para 4,2%.

“É poucochinho”

No final da segunda reunião da ronda de encontros, José Abraão, secretário-geral da Fesap, a segunda estrutura sindical a ser recebida, considerou que a proposta “fica muito aquém daquilo que eram as expectativas sobre todos os aspectos” em relação aos “aumentos extraordinários”. Afirmando que a proposta do Governo “é poucochinho, é insuficiente”, José Abraão acredita que “haja margem para maiores aumentos”.

Antes da Fesap foi recebido o Sindicato dos Quadros Técnicos do Estado (STE), cuja presidente, Maria Helena Rodrigues, no final defendeu que “não é uma proposta aceitável”. Mas adiantou que a sua organização sindical apresentará uma contraproposta.

Os dirigentes do STE  e da Fesap consideraram ainda cedo para qualquer decisão sobre uma nova greve por causa dos aumentos deste ano – a primeira decorreu a 31 de Janeiro -, mas José Abraão advertiu: “Está nas mãos do Governo, não nos empurrem para a rua.”

Já a Ana Avoila, coordenadora da Frente Comum, a última organização sindical a reunir com os representantes do Ministério, deixou a porta aberta a mais formas de contestação, não excluindo uma nova greve. Ana Avoila anunciou que a Frente Comum realizará no final do mês um plenário de sindicatos para aprovar formas de luta.

Considerando que a proposta “não é suficiente”, Ana Avoila assumiu que a Frente Comum não apresentará nenhuma contraproposta, já que o Governo não respondeu à que já foi apresentada pedindo um aumento mínimo de 90 euros por trabalhador em 2020.

São José Almeida e Sérgio Aníbal 10 de Fevereiro de 2020, Público