Teletrabalho também será obrigatório nos serviços públicos dos concelhos de risco

Cerca de 29 mil funcionários públicos estavam em teletrabalho no final de Setembro, mas com as regras que entraram agora em vigor o número poderá aumentar. Teletrabalho não se aplica a trabalhadores dos serviços essenciais nem de atendimento ao público.

Os serviços públicos situados nos 121 concelhos de risco também serão obrigados a adoptar o teletrabalho, desde que as funções em causa o permitam e não se trate de serviços essenciais ou de atendimento ao público, esclareceu o Ministério da Modernização do Estado e da Administração Pública. Porém, os funcionários públicos não são abrangidos pelos mecanismos previstos para o sector privado e que permitem ao trabalhador contestar a decisão da empresa de não adoptar o teletrabalho.

O PÚBLICO questionou o Ministério da Administração Pública se o artigo 5.º do Decreto-lei 94-A/2020 (que estipula as regras do teletrabalho obrigatório nos concelhos de risco e os procedimentos a adoptar) também se aplica aos organismos públicos e se os funcionários também poderão contestar, junto da Autoridade para as Condições de Trabalho ou de outra entidade, as decisões dos serviços que não adoptam o teletrabalho. Na resposta, o Governo afirma que, embora o teletrabalho seja obrigatório nos serviços situados nos 121 concelhos identificados, o regime que se aplica aos funcionários públicos é diferente do privado.

O artigo em causa, esclareceu fonte oficial do ministério, “é aditado a um diploma que se aplica exclusivamente às entidades que se encontram no âmbito de aplicação do Código do Trabalho (entidades privadas)”. “Relativamente à Administração Pública, e nos termos do n.º 10 do artigo 28.º da RCM n.º 92-A/2020, o teletrabalho apenas é obrigatório nos 121 concelhos identificados, desde que as funções desempenhadas sejam compatíveis. Por exemplo, não é aplicável aos trabalhadores dos serviços essenciais a que se refere o artigo 10.º do Decreto-lei n.º 10-A/2020, na sua redacção actual, nem à prestação de trabalho no âmbito dos serviços de atendimento ao público”, precisou a mesma fonte.

Ou seja, as normas que salvaguardam a situação dos trabalhadores que queiram contestar a decisão do empregador de não adoptar o teletrabalho não se aplicam

No privado, as empresas dos 121 concelhos onde o risco de contágio da covid-19 é maior são obrigadas a adoptar o regime de teletrabalho, sempre que as funções o permitam, e o empregador tem de comunicar “fundamentadamente e por escrito” ao trabalhador quando entende que as funções não são compatíveis com o teletrabalho ou não tem “condições técnicas mínimas” para o fazer. O trabalhador, por seu lado, tem três dias para pedir a intervenção da Autoridade para as Condições de Trabalho, caso não concorde com a avaliação feita pela empresa.

No sector público, as situações em que o teletrabalho não pode ser adoptado ficam expressas à partida. Desde logo, ficam de fora os trabalhadores de serviços essenciais e de atendimento ao público.

Mas as perguntas e respostas publicadas no site da Direcção-Geral da Administração e do Emprego Público (DGAEP) têm um leque mais alargado de situações em que os trabalhadores têm de estar no seu posto de trabalho. Situações em que o teletrabalho não se pode aplicar. Entre essas situações está a decisão do dirigente máximo do serviço “atendendo à necessidade de ser prestado apoio técnico ou administrativo presencial aos dirigentes ou trabalhadores que se encontrem em exercício presencial de funções”; quando a natureza das funções seja necessária para assegurar o normal funcionamento dos serviços e garantir o cumprimento de deveres e obrigações essenciais, como o processamento de salários ou a assistência informática; ou quando as funções impliquem acesso a bases de dados que não possam ser acedidas fora do posto de trabalho ou impliquem tratamento de informação reservada ou confidencial.

A DGAEP também refere que o empregador deve sempre justificar devidamente as situações em que considere que as funções não são compatíveis com teletrabalho. Já quanto à possibilidade de o trabalhador contestar essa decisão, nada se diz.

29 mil funcionários em teletrabalho

Durante o confinamento, cerca de 68 mil funcionários públicos estiveram em teletrabalho. Os dados mais recentes, relativos a 30 de Setembro, dão conta de cerca de 29 mil trabalhadores em teletrabalho, total ou rotativo, sendo que, esclarece o Ministério da Administração Pública, este número tem por referência apenas os trabalhadores cujas funções são compatíveis com o teletrabalho.

A partir do próximo ano, assegura o Ministério, a informação do número de funcionários em teletrabalho passará a ser recolhida com o Sistema de Informação da Organização do Estado.

A questão do teletrabalho deverá ser um dos assuntos abordados nesta sexta-feira durante as reuniões entre o secretário de Estado da Administração Pública, José Couto, e os sindicatos. As estruturas da função pública tinham pedido uma reunião suplementar ao Governo para continuarem a discutir matérias relacionados com o Orçamento do Estado para 2021, em particular os aumentos salariais.

O Governo não tem mostrado abertura para aumentar de forma transversal todos os trabalhadores do Estado, propondo apenas actualizar o salário de cerca de 100 mil trabalhadores do Estado, acompanhando a subida do salário mínimo nacional.

Na conferência de imprensa para apresentar o OE, o ministro das Finanças, João Leão, garantiu que subida do salário mínimo “fará aumentar o salário mínimo da Administração Pública”. “A forma como isso afectará os salários da Administração Pública terá de se discutir com os sindicatos”, disse ainda.

Neste momento, a remuneração mais baixa do Estado é de 645,07 euros, enquanto o salário mínimo no sector privado é de 635 euros e deverá subir 24 ou 25 euros. Se assim for, o salário mínimo passará para cerca de 660 euros, obrigando o sector público a aumentar os salários mais baixos para, pelo menos, este valor.

Os sindicatos não se conformam com esta decisão e não se deixam convencer com a promessa de revisão do sistema de avaliação da função pública e da tabela remuneratória única durante o próximo ano.

Raquel Martins 6 de Novembro de 2020, Público