O centro de medicina digital na Universidade do Minho dá consultas a todo o país

Chama-se P5 e pode bem ser o futuro em matéria de cuidados à população. O Centro de Medicina Digital tem sede em Braga, mas chega a todo o país e aos portugueses no estrangeiro. Guimarães e Paredes de Coura já integram o projeto.

Há um centro de medicina digital que a partir da Universidade do Minho presta cuidados de saúde a pessoas em todo o mundo. O P5 nasceu há dois anos e já realizou mais de 500 consultas, envolvendo diversas especialidades.

A ideia inicial foi ajudar a Escola de Medicina da UM a conseguir concretizar a sua missão - "que é melhorar os cuidados de saúde das populações que servimos através de três pilares: o mestrado integrado em Medicina - e os outros programas doutorais que temos -, a investigação - um segundo pilar que está centrado na geração do conhecimento - e por último, o valor, que inclui o valor social. Ora, numa escola médica, isso tem que traduzir-se em cuidados de saúde", explicou ao DN Nuno Sousa, presidente da Escola de Medicina e diretor do P5, que considera o projeto "o laboratório perfeito para a investigação em medicina digital e saúde das populações". Além disso, pode bem ser uma fonte de treino dos estudantes, que assim aprendem a ganhar competências clínicas em ambiente digital.

"Acreditamos que isto vai ser a prática médica comum dentro de pouco tempo", considera Nuno Sousa. Apesar de contar apenas com dois anos de existência, as raízes deste projeto são mais fundas.

"Nós criámos há cerca de 18 anos um laboratório, que é um instituto de investigação biomédica fundamental, e um centro de investigação clínica - que foi criado há oito anos, em parceria com o Hospital de Braga", adiantou o diretor. Na altura, a reflexão foi: "Como é que uma instituição pública, sem fins lucrativos, pode adicionar valor à saúde em Portugal. Nós podíamos ter criado uma clínica universitária. Mas isso só ia ter um impacto local. E não iria aportar valor significativo ao nosso sistema de saúde. E então decidimos apostar na medicina digital."

Os alunos foram envolvidos em diversas fases do projeto, com destaque para a triagem ligada à covid-19. Mas dão também "uma ajuda na triagem e na dimensão da doença crónica, a quem nos propusemos dar apoio continuado".

Nuno Sousa sublinha a importância da aposta na medicina digital, "que não tem necessariamente que afastar as pessoas". De resto, sabe-se que assim serão os cuidados de saúde do futuro. Ou melhor, do presente, afirma. "Começámos em pré-pandemia, foi esperar uns meses e fomos mais precisos que nunca", acrescenta o diretor do P5.

O centro tem dimensão muito variável, como explica ao DN. "Durante os picos da pandemia, criámos um help desk onde pedimos a ajuda de centenas de estudantes de Medicina. Mas fora esses, trabalhamos com mais de uma dezena de médicos, enfermeiros, psicólogos - estes têm um duplo papel, tanto na área da psicoterapia como fazendo health coach", frisou o responsável. "Imaginemos que estamos a falar com alguém na área da hipertensão. Essa pessoa vai tentar entender quem é o hipertenso que tem à sua frente (do outro lado) e promover uma maior ligação para que ele tenha maior adesão aos planos terapêuticos que lhe são prescritos", adianta o diretor do centro, onde a ideia é fazer acompanhamento permanente.

"Nós não queremos deixar as pessoas que estão connosco no P5 sozinhas. A ideia é alterar o relacionamento com o doente. Um médico marca uma consulta (convencional) para daqui a três ou seis meses e durante esse período de tempo eu não sei o que se passa com o doente. Hoje, com a tecnologia, com esta possibilidade de estarmos em contacto permanente com as pessoas, temos forma de os monitorizar e conseguir chamá-los a nós sempre que é necessário."

Mais próximos de Guimarães e Paredes de Coura

O P5 estabeleceu, entretanto, protocolos com duas comunidades, através das Câmaras de Paredes de Coura e Guimarães, o que lhe permitirá chegar a perto de novos 175 mil utentes.

Os dois municípios podem beneficiar dos serviços clínicos de triagem e de sintomas de uma forma totalmente gratuita, ao abrigo desse protocolo. "São desafios distintos. Em Paredes de Coura temos uma população muito mais envelhecida, com menos conforto e com menor literacia digital. Em Guimarães é uma população mais urbana, mais jovem, com muito maior cultura digital. Optámos [aí] por nos focar nos extremos, nas escolas e nos mais seniores. Até procurando que os mais jovens assumam o papel de curadores dos estados de saúde dos mais velhos", justifica Nuno Sousa, salvaguardando sempre que a ideia subjacente a todo o projeto é "criar a cultura da saúde. Temos em Portugal muito a cultura de que a saúde é para tratar a doença. O que queremos é o contrário: vamos ser saudáveis mais tempo".

Qualquer pessoa pode chegar aos serviços do centro de medicina digital, nomeadamente através da página. Não importa a zona do país (ou fora dele) em que está. Na página está disponível um avaliador de sintomas, que através da inteligência artificial gera um relatório e encaminha os pacientes para a especialidade, sendo que um médico entra sempre em contacto com quem utiliza os serviços da clínica.

A maior parte dos utilizadores da P5 está fora de Portugal. São portugueses que vivem em países diversos e que, mesmo falando fluentemente outras línguas, preferem o conforto de falar português quando o tema é a saúde.

Nuno Sousa acredita que "daqui a 20 anos a maioria dos contactos médicos vai acontecer assim, pela via digital". É para isso que trabalha a equipa que coordena, na procura da acessibilidade aos cuidados de saúde. "Porque não é a mesma coisa estar num centro urbano ou num meio rural, num meio mais ou menos favorecido. O acesso não é igual em Portugal. Por isso o que queremos é contribuir para melhorar a prestação de cuidados de saúde em Portugal."

Diário de Notícias – Paula Sofia Luz - 11 julho 2021