Politécnico de Beja abre concursos de promoção a que só podem concorrer os seus vice-presidentes
Vaga para o topo da carreira nas ciências empresariais foi contestada até pelo próprio departamento. Conselho geral não aprovou mapa de pessoal do qual constavam estes lugares.
O Instituto Politécnico de Beja (IPB) abriu dois concursos internos de promoção, de acesso ao topo da carreira do ensino superior politécnico, a que só podem concorrer os seus dois vice-presidentes. Uma das vagas, na área das Ciências Empresariais, foi contestada pelo próprio departamento em que se insere, que preferia usar esse dinheiro para contratar mais professores. O conselho geral também não aprovou o mapa de pessoal para este ano, onde constavam esses lugares.
Os dois concursos foram abertos formalmente a 12 de Junho do ano passado. Nesse despacho, a presidente do IPB, Maria de Fátima Carvalho, cria três vagas para professor coordenador principal, o topo da carreira nos politécnicos, uma na área de Ciências Empresariais, outra no Desporto e outra que admite candidatos de Ciências Agrárias ou Ciências Biológicas. Além disso, foram abertas dez vagas para professor coordenador, a posição intermédia da mesma carreira.
Depois de anos em que as promoções internas nas instituições de ensino superior estiveram praticamente congeladas, o Governo socialista, ainda com Manuel Heitor como responsável do sector, criou um regime em que os concursos de promoção interna passam a ter regras distintas dos concursos de recrutamento de novos docentes. Até então, o acesso às categorias do topo da carreira tinha obrigatoriamente de ser feito por concurso público internacional. É com base nestas regras que têm sido feitas as promoções na generalidade das instituições de ensino superior e o IPB não é excepção.
O que tem criado polémica no Politécnico de Beja é o facto de, das três vagas para o topo da carreira, apenas uma, a que admite candidatos de Ciências Agrárias ou Ciências Biológicas, poder ter mais do que um opositor. Nas outras duas, só reúnem as condições para concorrer os vice-presidentes da instituição, José Jacinto Bilau, na área das Ciências Empresariais, e Nuno Marques de Loureiro, no Desporto.
Estes são actualmente os dois únicos vice-presidentes do Politécnico de Beja, instituição onde, no último ano e meio, se demitiram, por divergências que foram públicas com a presidente da instituição, um vice-presidente, dois pró-presidentes, além de vários directores e vice-directores de escolas. Somam-se já mais de uma dezena de baixas nos cargos dirigentes desde a tomada de posse em Novembro de 2021.
A presidente, Maria de Fátima Carvalho, afasta qualquer favorecimento dos seus “número 2”. “Estes concursos abrangem todos os departamentos onde existiam docentes com o título de agregado, condição indispensável para concorrer nesta categoria”, justifica ao PÚBLICO.
A mesma responsável acrescenta que o politécnico devia ter 11 professores coordenadores principais, mas tem apenas dois e que essas posições são necessárias para “aumentar a probabilidade” da atribuição da liderança de consórcios ou projectos de investigação, “para além de constituírem factor geral de credibilização da instituição”.
Maria de Fátima Carvalho garante ainda que “a escolha das áreas científicas [em que foram abertos os concursos] foi precedida de estudo e análise nos órgãos competentes, não tendo sido uma decisão da presidência.”
Não é isso, no entanto, que mostram as actas das reuniões de dois órgãos da instituição, nos meses anteriores ao lançamento destes concursos. A abertura de um lugar de professor coordenador principal “não é prioritário”, deixou escrito o Departamento de Ciências Empresariais na acta da sua reunião de 5 de Maio do ano passado. Acrescentavam os docentes que ali têm assento que a intenção de abertura dessa posição não foi proposta pela direcção do departamento à presidência do IPB, com quem se tinham reunido anteriormente.
Mais professores, defende departamento
“A eventual necessidade e pertinência para o departamento não nos foi demonstrada e nem sequer tal tema foi abordado na referida reunião”, lê-se também no documento. O departamento considera “mais urgentes e importantes” outras opções, como contratar mais professores ou promover às posições intermédias quem está no início da carreira, soluções que têm sido bloqueadas pelos “regulares avisos da presidência de que não existe orçamento”.
Na carreira dos institutos superiores politécnicos, um professor coordenador principal recebe, no mínimo, 5000 euros brutos mensais, se estiver em regime de exclusividade, ao passo que um professor coordenador, mesmo que já tenha agregação, tem um salário bruto de 4300 euros mensais. Sem agregação, o salário não chega aos 3900 euros.
A necessidade dos concursos de promoção ao topo da carreira também não foi validada pelo conselho geral, o órgão máximo da instituição, a quem compete, em cada ano, aprovar o mapa de pessoal do instituto, juntamente com o seu orçamento. Na reunião de 27 de Março do ano passado, os conselheiros decidiram deixar em acta que, no orçamento então colocado à votação, “não se inclui qualquer alusão ou votação relativa ao mapa de pessoal docente e não docente”.
A decisão expressava o desacordo existente relativamente às intenções da presidência, sintetizadas pela conselheira Elsa Rodrigues, que “voltou a reiterar a importância de aumentar o número de concursos para professores adjuntos”, isto é, dos lugares intermédios da carreira, em detrimento dos lugares de topo.
Apesar de os lugares para os quais abriu concurso não constarem do mapa de pessoal, a presidente Maria de Fátima Carvalho não vê irregularidade na situação. Os gastos com pessoal “são a justificação para cerca de 80% do total do orçamento proposto” e esse orçamento “foi aprovado pelo conselho geral”, entende.
Samuel Silva, 13 de Julho de 202, Público