Director da Nova Business School devolve 32 mil euros de vencimentos

Inspecção de Educação levantou dúvidas sobre a acumulação do lugar de docente e administrador do Santander. Daniel Traça deixa de receber verba extra por dedicação exclusiva.

O director da Nova Business School of Economics (Nova SBE), antiga Faculdade de Economia da Universidade Nova de Lisboa (UNL), Daniel Traça, abdicou de receber o seu salário como docente em dedicação exclusiva, que lhe permitia um acréscimo de 30% do valor base, depois de a Inspecção-Geral de Educação e Ciência (IGEC) ter levantado dúvidas sobre a legalidade de este professor ser simultaneamente pago como administrador do banco Santander. Vai também devolver à instituição cerca de 32 mil euros auferidos ao abrigo desse regime no último ano e meio.

A decisão de Daniel Traça foi comunicada à universidade nos últimos dias, depois de a IGEC levantar “dúvidas relativamente à desigualdade da situação de dedicação exclusiva” numa auditoria recente, cujas conclusões foram enviadas esta semana pelo ministro da Ciência e Ensino Superior, Manuel Heitor, ao reitor da UNL.

Traça assumiu a liderança da Nova SBE no início de 2015, tendo sido reeleito em Dezembro de 2018. Na mesma altura, foi também escolhido para integrar a administração do Santander, onde é administrador não executivo e recebe um vencimento. Na semana passada, o Diário de Notícias dava conta de que auferiu, em 2019, 143 mil euros pelo desempenho dessas funções no banco.

Os professores do ensino superior com dedicação exclusiva recebem um suplemento de vencimento de 30%. Num relatório publicado no mês passado, o Tribunal de Contas alertava que há cerca de uma década que as universidades têm mostrado dificuldades em impedir violações a este regime.

No caso de Daniel Traça, o seu salário de base é o de professor catedrático – 5417 euros mensais brutos – a que acrescem 458 euros brutos mensais de acréscimo remuneratório por ocupar funções de direcção. Ou seja, em cada mês recebe perto de 1800 euros ao abrigo do regime de dedicação exclusiva. Atendendo a que o director da Nova SBE está há 18 meses na administração do banco Santander, terá que devolver à universidade cerca de 32 mil euros.

A auditoria à situação de Daniel Traça foi realizada em sequência de uma denúncia enviada à IGEC. Além de uma possível violação ao regime de dedicação exclusiva, era também colocado em causa o facto de o cargo de director de faculdade ter que ser obrigatoriamente “exercido em regime de dedicação exclusiva” de acordo com os estatutos da Universidade Nova de Lisboa.

A inspecção considera, porém, “não haver ilegalidade” na acumulação do cargo de director de faculdade com o de administrador não executivo do Santander. Isto porque os estatutos da Universidade Nova de Lisboa também autorizam a acumulação do lugar de director com outras funções “mediante prévia autorização do reitor”.

Foi isso que aconteceu no caso de Daniel Traça, garante ao PÚBLICO, o reitor da UNL, João Sáàgua, que considerou que o caso “não configurou qualquer incompatibilidade de funções”. O reitor afirma também que “sempre que necessário, foram pedidos pareceres jurídicos externos e ouvido o Conselho de Ética da UNL” sempre que foram apresentados pedidos de acumulação de funções por docentes ou dirigentes da instituição, ainda que não especifique se foi assim no caso de Traça.

“A acumulação de funções de dirigentes de instituições de ensino superior e/ou de docentes é uma prática comum nas Universidades de todo o mundo e em todas as Universidades públicas portuguesas”, justifica ainda João Sáàgua, numa resposta enviada por escrito.

O Santander, de que Daniel Traça é administrador não executivo, foi uma das empresas que financiou a construção do campus de Carcavelos da Nova SBE e integra os fundadores da Fundação Alfredo de Sousa, criada para gerir o processo de angariação de verbas para as novas instalações, juntamente com a Câmara Municipal de Cascais, a Jerónimo Martins e Teresa e Alexandre Soares dos Santos. Na semana passada, a UNL anunciou a criação de uma “comissão independente” para avaliar as suas relações com as empresas, que vai ser liderada pela antiga ministra da Modernização Administrativa e actual Eurodeputada Maria Manuel Leitão Marques.

Samuel Silva - 18 de Julho de 2020, Público