Universidade Nova de Lisboa  Ordem avalia acumulação de funções da directora da Faculdade de Direito da Nova

Mariana França Gouveia mantém actividade como advogada e é sócia da PLMJ, uma das principais sociedades nacionais. Também tem assento na administração da Martifer, com autorização do reitor.

A Ordem dos Advogados (OA) está a avaliar se o facto de Mariana França Gouveia liderar a Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa (UNL) e ser advogada no activo é legal. O Estatuto dos advogados considera incompatível com a profissão administrar um organismo público, mas abre excepções para os professores. O reitor da universidade autorizou esta acumulação, apesar de o cargo exigir dedicação exclusiva.

Mariana França Gouveia é, desde Julho de 2018, sócia, na área de resolução de litígios, da PLMJ, uma das maiores sociedades de advogados do país, fundada nos anos 1960. Dois meses depois foi eleita directora da Faculdade de Direito da UNL. O Estatuto da Ordem dos Advogados prevê um conjunto de incompatibilidades com o exercício da profissão, entre as quais ser membro de um órgão de administração ou direcção de uma entidade pública, como é o caso daquela universidade.

É a possível incompatibilidade entre estas duas funções que está a ser avaliada pela Ordem, confirmou ao PÚBLICO a presidente do Conselho de Deontologia de Lisboa da OA, Alexandra Bordalo Gonçalves. O caso está em “apreciação liminar” depois de, nos primeiros meses deste ano, terem chegado àquele organismo duas participações visando França Gouveia. Alexandra Bordalo Gonçalves recusou fazer mais comentários, dado que o processo ainda está a decorrer. Também o bastonário da Ordem, Luís Menezes Leitão, recusou pronunciar-se sobre este tema.ir

Mariana França Gouveia entende que não há qualquer ilegalidade na sua situação. O estatuto da Ordem, que tem força de lei, prevê algumas excepções às incompatibilidades listadas, como o exercício de mandato como deputado na Assembleia da República ou a docência. A directora da Faculdade de Direito da UNL acrescenta que, entre as funções dos professores universitários previstas no Estatuto da Carreira Docente Universitária está “participar na gestão das respectivas instituições universitárias”. Ou seja, a excepção para a actividade de docência abrange a liderança da faculdade, defende.

A directora da faculdade de Direito da UNL é professora na instituição desde 2003. Sendo a sua especialidade, Processo Civil e resolução alternativa de litígios, “eminentemente prática”, diz ter sentido “necessidade” de ter essa experiência. “Ensinar futuros profissionais forenses sobre como agir em tribunal, sem o fazer na prática, é como ensinar cirurgia sem nunca ter operado um doente”, afirma. França Gouveia lembra também que “é prática comum os professores de Direito das universidades públicas portuguesas exercerem funções fora da academia, como advogados, consultores ou juristas de empresas”.

A advocacia não é o único trabalho que Mariana França Gouveia faz ao mesmo tempo que dirige a Faculdade de Direito da UNL. Em Maio de 2018, quatro meses antes de ter assumido a liderança da instituição de ensino superior, tornou-se administradora não executiva da Martifer SGPS, holding cotada em Bolsa. Os estatutos da universidade exigem que o cargo de director seja obrigatoriamente “exercido em regime de dedicação exclusiva”, mas pode haver acumulação de funções “mediante prévia autorização do reitor”.

Foi isso que Mariana França Gouveia fez, há quase dois anos. A autorização foi concedida por João Sáàgua, confirmou o PÚBLICO junto da reitoria da UNL. Foi um processo semelhante ao de Daniel Traça, director da Nova School of Business and Economics, também autorizado a manter essa posição ao mesmo tempo que era administrador não executivo do banco Santander. Traça vai devolver 32 mil euros à universidade depois de a Inspecção-Geral de Educação e Ciência (IGEC) ter levantado dúvidas sobre a legalidade de receber um bónus salarial de 30% do vencimento como professor universitário, ao mesmo tempo que o banco lhe pagava 143 mil euros, no último ano.

Neste aspecto, o caso de Mariana França Gouveia é, porém, diferente. Ao contrário de Daniel Traça, a directora da Faculdade de Direito da Nova nunca recebeu o suplemento salarial por dedicação exclusiva. O seu salário como docente tem apenas um acréscimo remuneratório pelo facto de exercer um cargo de direcção no valor de 458 euros brutos mensais.

Samuel Silva - 22 de Julho de 2020, Público