Polémica na RTP: empresa manda mail a ex-precários a pedir que paguem Segurança Social, trabalhadores indignam-se

Empresa enviou um primeiro e-mail em que admitia, no limite, retirar dinheiro ao salário dos trabalhadores. Foi entretanto enviado um segundo e-mail em que a RTP corrige a natureza do pedido

Depois da uma luta de anos, a RTP integrou vários trabalhadores - muitos jornalistas mas não só - que há anos vinham prestando serviços essenciais ao canal público de rádio e televisão. Mas na semana passada um e-mail do departamento de Recursos Humanos da empresa pedindo o reembolso das contribuições para a Segurança Social adiantadas pela RTP (segundo ordem no tribunal) causou um grande indignação entre os trabalhadores.

Importa esclarecer primeiro de que caso se trata: falamos do regime especial de reintegração de alguns dos precários da RTP. No caso específico de 25 dos trabalhadores reintegrados, o tribunal ordenou que a RTP regularizasse contribuições, ou seja, que fossem assinados contratos que reconhecessem como tempo efetivo de contrato o tempo que determinada pessoa esteve a trabalhar para a RTP por conta própria. Por exemplo, um trabalhador que conseguisse provar que há três anos vinha colaborando diariamente com a RTP, então o subsequente contrato assinado após sentença obrigava a empresa a reconhecer esses anos três anos como efetivos.

Nos contratos por conta de outrem, a empresa (qualquer empresa) entrega à segurança social, em nome do trabalhador, 11% dos rendimentos do trabalhador, os outros 23,75% relativos ao rendimento bruto são pagos em nome da empresa. Ora, a Segurança Social pediu à RTP que repusesse os 11% mas também os 23,75% de todos os trabalhadores que o tribunal reintegrou.

No seguimento desta ordem, e tendo em conta que os 11% são de facto uma "despesa" dos trabalhadores, a RTP enviou a estas cerca de 20 pessoas um email onde se pedia a regularização dos 11% até ao fim do mês de julho. Depois de uma explicação sobre o valor “adiantado” aos trabalhadores, lê-se no e-mail dos Recursos Humanos da RTP que “assim terá [o trabalhador] agora de regularizar o pagamento do valor de (montante ) até dia 26 de julho de 2019”. Caso isso não seja possível, o departamento pede que a pessoa em questão marque uma hora para a discussão de um plano faseado de pagamento. Caso não efetue nem o pagamento nem o contacto, então a RTP tencionava retirar do ordenado de cada trabalhador o montante indicado. “Na ausência desse contato, a RTP dará início no mês de agosto de 2019 ao desconto do valor acima indicado, até ao limite de 1/6 da sua remuneração líquida mensal”, lê-se no e-mail.

Alguns trabalhadores da RTP e Antena 1 contactados pelo Expresso manifestaram-se chocados com os emails que receberam, até porque, tal como é certo que este valor deve ser reposto à RTP, também estes trabalhadores gostariam de ver repostos todos os subsídios de refeição, pernoitas e férias, entre outras coisas, de acordo com o tempo de serviço decretado pelo tribunal.

Um membro do sindicato dos jornalistas que está desde o início do processo em contacto com as pessoas potencialmente afetadas por esta medida levanta algumas questões que os próprios trabalhadores levantaram junto do aconselhamento jurídico do sindicato. "'Se a RTP não tinha um salário definido para mim, sobre que valor fez a conta dos 11%?"' é uma das perguntas que mais que fazem", explica ao Expresso. Outra é esta: "Se reconheceu a existência de um contrato de trabalho e não de prestação de serviços, a partir dessa data os trabalhadores têm a possibilidade de exigir tudo o que não lhe pagaram nesse tempo?". O recurso aos tribunais, uma via que muitos já tinham afastado, regressou agora às possibilidades. "Imagino que muitos que tinham até deixado passar, por não quererem mais problemas com a sua própria entidade empregadora, sejam obrigados agora a rever a sua posição", diz a mesma fonte.

Esta terça-feira, depois de um comunicado bastante crítico do Sindicato de Jornalistas emitido no fim da semana passada, fonte oficial da RTP confirmou ao Expresso que os trabalhadores receberam um segundo e-mail, assegurando que os valores que têm a pagar à RTP só lhes serão pedidos depois de eles mesmos receberem da Segurança Social o valor que durante o tempo em que eram pagos por recibo verde tiveram de entregar. “Estes trabalhadores, que pagaram as suas contribuições à Segurança Social enquanto prestadores de serviços, deverão ser ressarcidos, dado que já foi paga a contribuição pela entidade patronal enquanto trabalhador da RTP”, diz a mesma fonte. O Expresso teve também acesso ao texto do e-mail enviado esta terça com esclarecimentos aos 25 trabalhadores, onde agora se escreve que, afinal, o trabalhador não verá na sua conta uma tributação forçada. “A RTP irá assegurar que o trabalhador não fica penalizado por uma dupla tributação, coordenando o momento de pagamento do valor devido à empresa com o recebimento do montante que lhe será devolvido pela Segurança Social, referente aos pagamentos que terá efetuado enquanto prestador de serviço”, lê-se no email.

Na sexta-feira, dia 5 de julho, pelas 16h, haverá uma reunião de esclarecimento.

02.07.2019 Expresso on line Ana França