Ensino superior Novo indicador de excelência determina cortes numa centena de licenciaturas das duas maiores cidades.

Turismo não escapa à redução. Concurso arranca quarta-feira

Lisboa e Porto aumentam vagas nos cursos com médias mais altas

Foram quase 20 os cursos que, no ano passado, deixaram de fora candidatos em 1ª opção (nalguns casos mais de uma centena) com uma média igual ou superior a 17 valores. Cinco são de Medicina e não poderão abrir mais vagas do que no concurso de 2018, já que a tutela tem mantido o congelamento da oferta nesta área. Mas em relação aos restantes (ver lista ao lado), o Ministério do Ensino Superior determinou que devem aumentar a capacidade, disponibilizando um mínimo de 5% e um máximo de 15% lugares a mais.

As universidades de Lisboa e do Porto — as únicas que reúnem estas condições — vão responder com o máximo, antecipam ao Expresso. “Estávamos a deixar de fora alunos com notas muito altas e vemos esta determinação como muito positiva. Por isso vamos aumentar as vagas em 15% em todos os cursos que tiveram mais candidatos com notas de excelência do que as vagas disponíveis”, garante o reitor da Universidade de Lisboa (UL), António Cruz Serra.

Na Universidade do Porto, a opção será a mesma, até porque permite recuperar parte do corte de vagas a que as instituições das duas maiores cidades foram obrigadas no ano passado, explica a vice-reitora Maria de Lurdes Correia Fernandes. Com exceção de Arquitetura, que tem uma taxa de desemprego elevada, as restantes seis formações elegíveis vão oferecer mais 15% de lugares: “Temos alunos excelentes a procurar-nos e temos capacidade instalada para isso”, justifica.

De acordo com o levantamento do grupo de trabalho nomeado pelo ministro Manuel Heitor e liderado pelo presidente da Comissão Nacional de Acesso ao Ensino Superior, João Guerreiro, o mestrado integrado em Engenharia Física e Tecnológica do Instituto Superior Técnico da UL foi a formação que mais candidatos de 17 ou mais valores deixou de fora: 167 colocaram-no em 1ª opção, sendo que vagas eram só 60. Ou seja, o seu índice de excelência foi de 278. Agora serão abertos mais nove lugares.

A possibilidade de aumentar a oferta em todos os cursos do país que tiveram um índice de excelência igual ou superior a 100 está prevista no despacho de vagas para 2019/20 e é uma das novidades trazidas por um diploma que, na versão do ano passado, determinava um corte cego de vagas em todas as universidades e politécnicos localizados em Lisboa e Porto.

A medida gerou muitas críticas por parte das instituições atingidas — que tiveram de reduzir um total de 1100 lugares — e foi agora alvo de novos critérios, sugeridos pelo grupo de trabalho. O objetivo da tutela é promover uma maior dispersão de estudantes pelo país, já que mais de metade (54%) concentra-se em instituições de Lisboa e do Porto.

Cursos sem alunos de excelência

No caso específico do índice de excelência, o critério é usado para aumentar a oferta, mas também para a reduzir no que respeita às instituições sedeadas em Lisboa e Porto. Ou seja, as escolas das duas cidades têm de reduzir mais 5% da oferta nos cursos que no ano passado não atraíram um único candidato com um mínimo de 17 valores de média. Excetuam-se as licenciaturas que visem a formação em “competências digitais e ciências de dados”, determina o despacho.

O grupo de trabalho identificou 112 cursos em Lisboa e Porto que, tendo aberto mais de 20 vagas no concurso de 2018, não tiveram nenhum candidato de 17 ou mais valores de média. Tirando os casos que se enquadrem na exceção admitida pelo Ministério, e que estão em minoria, todos os outros têm de continuar a reduzir as vagas.

Na maioria dos casos, essa diminuição pode não ter efeitos práticos já que são cursos que têm ficado com lugares por preencher. Mas noutros a consequência será a de deixar à porta ainda mais candidatos. Acontece com várias formações nos institutos politécnicos, em regime pós-laboral e mesmo em áreas que são estratégicas para o país.

Gestão das Atividades Turísticas no Politécnico do Porto, em que a procura no ano passado triplicou a oferta (117 candidatos em 1ª opção para 35 lugares), e Gestão do Lazer na Escola Superior de Hotelaria e Turismo do Estoril (ESHTE) são apenas dois exemplos.

Turismo volta a perder vagas

O facto de o despacho não prever uma exceção nos cortes em Lisboa e Porto na área do turismo foi uma das críticas apontadas pela ESHTE, lembra a direção da escola, assinalando a contradição entre o reconhecimento pelo Governo do “papel fundamental que o turismo pode assumir como motor de desenvolvimento do país e as opções do Ministério do Ensino Superior”. Além da já identificada necessidade de qualificação de recursos humanos neste sector, a ESHTE questiona a eficácia da medida.

“Duvidamos fortemente que a redução de vagas nos cursos de turismo em Lisboa e Porto tenha um efeito de vasos comunicantes e que induza uma procura superior nas escolas do interior do país”, analisa a escola, concluindo que a perda de 44 alunos em dois anos (pelos cortes de 5% de 2018 e agora de 2019) trará benefícios apenas para as instituições privadas da capital.

A posição da ESHTE foi apoiada pelo Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos (CCISP) que, na posição enviada à tutela, acrescentou outras notas críticas. É que também não foram previstas exceções para os cursos oferecidos em regime pós-laboral, lembra o presidente Pedro Dominguinhos, temendo ainda mais uma consequência perversa de diploma: “A ponderação do indicador de excelência pode levar a uma penalização maior dos politécnicos em relação às universidades”, avisa.

As três universidades de Lisboa e a do Porto têm um número muito reduzido de formações com zero candidatos de 17 valores. E é nos politécnicos que, regra geral, estão as médias mais baixas. “No caso da UL estamos a falar de um corte inferior a 15 vagas no total. Não é significativo. Mas não faz sentido obrigar uma formação que tem muita procura a cortar lugares tendo, por exemplo, candidatos de 16 valores. Mas uma formação pouco atrativa que tenha um estudante com essa média não precisa de fazer nada”, critica Cruz Serra.

Já a manutenção de regras diferentes para a fixação de vagas consoante a região do país (de maior e menor pressão demográfica) merece o aplauso do presidente do CCISP: “A diferenciação entre interior e litoral não é o único instrumento de coesão territorial. Mas é importante.”

Ao contrário de Lisboa e Porto, as universidades e politécnicos de regiões com menos população podem aumentar as vagas até 5%, desde que em formações em competências digitais e ciências de dados e em ciclos de estudo considerados estratégicos.

A questão é que não basta aumentar a oferta; é preciso que os alunos também queiram ir para lá. Para João Guerreiro, é fundamental para isso que as instituições menos procuradas apostem em eixos de especialização, relacionados com o tecido empresarial e as unidades de investigação na região, e centrem aí as suas apostas e recursos.

O presidente do grupo de trabalho gostaria ainda que o índice de dispersão — também calculado pela equipa e que avalia se cada uma das áreas de formação está disseminada pelo país ou se só existe em algumas regiões — seja tido em conta na reorganização da rede. “Não foi utilizado agora, mas penso que vai ser um instrumento fundamental no futuro.” Até porque há cursos com índices de procura muito baixos e que deveriam ser reconvertidos ou concentrados numa escola.

No concurso nacional de acesso do ano passado, 45 licenciaturas não atraíram nenhum candidato na 1ª fase.

Portal ajuda a conhecer cursos

Sabe qual o curso que apresenta a maior taxa de desemprego? O que tem mais estudantes estrangeiros inscritos? E qual o que tem maior taxa de desistência ao fim de um ano? O portal Infocursos (www.infocursos.mec), que compila informação sobre o sistema de ensino (básico, secundário e superior) permite encontrar as respostas a estas e muitas outras questões. Esta enorme base de dados foi recentemente utilizada e é agora apresentada informação não só para mais de 1700 licenciaturas e mestrados integrados, como também para os mais de 450 cursos superiores técnicos especializados (formação pós-secundária de dois anos que dá direito a um diploma de ensino superior e acesso a uma licenciatura) e quase dois mil mestrados.

A 1ª fase do concurso nacional de acesso ao ensino superior inicia-se na próxima quarta-feira e decorre até 6 de agosto. Os resultados das colocações serão conhecidos a 9 de setembro.

Isabel Leiria Expresso

Cursos em que os candidatos com média ≥ 17 valores superam as vagas

Podem aumentar vagas entre 5% e 15%

Fonte: GRUPO DE TRABALHO AUTOR DO Relatório Sobre o Acesso ao Ensino Superior, junho 2019

EXCELÊNCIA

O grupo de trabalho nomeado pelo ministro identificou 12 cursos que devem aumentar as vagas pelo seu índice de excelência, todos lecionados nas universidades de Lisboa (UL) e do Porto (UP). Engenharia Física e Tecnológica, no Instituto Superior Técnico, e Engenharia e Gestão Industrial na UP foram os que deixaram mais alunos de média igual ou superior a 17 de fora face às vagas apresentadas. Este último, por exemplo, poderá abrir mais 10 vagas.

Cursos com menos de 10 colocados nos três últimos anos letivos

Em risco de fechar

Fonte: GRUPO DE TRABALHO AUTOR DO Relatório Sobre o Acesso ao Ensino Superior, junho 2019

PROCURA

Os cursos que, em cada um dos últimos três anos, receberam menos de 10 novos alunos não poderão abrir vagas em qualquer modalidade de acesso. Mas há exceções: licenciaturas em artes do espetáculo (excluídas desta lista), nas áreas do digital e ciências de dados, em que não haja oferta alternativa no país ou que tenham mercado junto de estudantes internacionais.

Cursos sem desempregados inscritos no IEFP

Fonte: Fonte: Portal Infocursos, MCTES

EMPREGO

É um dos indicadores que tem sido usado pelo Ministério na regulação de vagas. Os cursos que tenham desemprego mais alto do que a média da instituição ou do que a média do país na respetiva área de estudo não podem aumentar o número de lugares. Mas também aqui há exceções, designadamente para escolas do interior. Este indicador é medido através do número de diplomados nos quatros anos letivos anteriores e o de inscritos no Instituto de Emprego e Formação Profissional que tiraram esses mesmos cursos. Por isso, pode pecar por defeito, já que a inscrição num centro de emprego não é obrigatória e o jovem pode ter emigrado ou ter começado a trabalhar noutra área. Nesta lista apenas estão identificados os cursos sem registos no final de 2018 e que diplomaram mais de 80 estudantes entre 2014 e 2017. A nível nacional a taxa de recém-diplomados inscritos no IEFP é de 3,4% no ensino público e de 4,1% no privado.