Universidade Católica quer criar centro de investigação para conseguir acreditação do curso de Medicina

Projeto passa por fundar um Centro Académico Clínico que integre um instituto biomédico, a Faculdade de Medicina e um hospital universitário, que deverá ser o Hospital da Luz

Promover o envelhecimento saudável através da investigação biomédica, de modo a aumentar o conhecimento sobre a biologia do envelhecimento e as doenças associadas - como o cancro, diabetes, problemas cardiovasculares ou doenças degenerativas - é o objetivo do instituto biomédico que a Universidade Católica Portuguesa (UCP) pretende criar. A iniciativa surge no âmbito da proposta de um novo curso de Medicina submetida à Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior (A3ES), que tomará uma decisão até ao final de setembro.

Pedro Simas, futuro diretor do novo centro de investigação, explica ao Expresso que "o futuro instituto faz parte do projeto integrado de criação de um Centro Académico Clínico, que inclui a Faculdade de Medicina e um hospital universitário". E reconhece que reforça o pedido de acreditação apresentado à A3ES, pelo que "só pode avançar se o novo curso de Medicina for aprovado". No fundo, o projeto do Centro Académico segue o modelo da Universidade de Lisboa, onde há uma integração e proximidade física do Hospital de Santa Maria, da Faculdade de Medicina e do Instituto de Medicina Molecular (iMM), um dos maiores centros de investigação de ciências da vida do país (500 investigadores).

"O ensino médico sempre se debateu com problemas de memorização", considera o investigador do iMM. "Mas com o uso de algoritmos de Inteligência Artificial que fazem o diagnóstico médico perfeito, o grande desafio do futuro é mais ensinar os alunos de Medicina a pensar, ensinar o método científico, de modo a que o currículo de um médico inclua também um projeto de investigação para aprender a fazer ciência" a partir da grande quantidade de dados disponíveis. "E para isso será necessário um centro de investigação dentro do Centro Académico Clínico da Universidade Católica", adianta Pedro Simas.

Hospitais privados interessados

O futuro instituto biomédico vai começar por recrutar cinco a dez investigadores principais que tenham ganho bolsas milionárias do Conselho Europeu de Investigação (ERC na sigla inglesa) ou outras bolsas de prestígio equivalente, bem como médicos e clínicos. O Grupo Luz Saúde está interessado em associar-se ao novo centro de investigação, tal como ao projeto da Faculdade de Medicina, mas Pedro Simas esclarece que há também outros hospitais privados interessados. "No prazo de dez anos queremos ganhar massa crítica em termos de recursos humanos, porque a nossa aposta no futuro passa por fazer investigação ligada à aplicação clínica (translational science), o que hoje é muito difícil de fazer em Portugal". Mas na fase de arranque a aposta será "na ciência fundamental".

O investigador admite que "vai ser difícil atrair os melhores talentos no início, porque o instituto será criado de raiz e só contamos com o prestígio da Universidade Católica". Por isso, há três apostas fundamentais: "nunca abdicar da excelência científica e investir no capital humano, mesmo demorando mais tempo; dar liberdade científica aos investigadores; e dar-lhes uma perspetiva de carreira". Para isso a Universidade Católica fará dois contratos com os cientistas a recrutar: um contrato de professor na Faculdade de Medicina e outro contrato de investigador no instituto biomédico. "Isto é crucial para termos vantagens competitivas em relação aos outros institutos nacionais de ciências da vida", destaca Pedro Simas.

E quanto ao financiamento? "O instituto biomédico não será criado a pensar nos recursos escassos da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT)", esclarece o investigador, "mas noutras fontes de financiamento, como as bolsas do Conselho Europeu de Investigação ou os apoios de instituições privadas como a Fundação La Caixa (Espanha), o Howard Hughes Medical Institute ou a Fundação Bill & Melinda Gates (EUA), por exemplo". A investigação em ciências da vida "é muito cara e por essa razão queremos atrair parceiros que nos garantam um financiamento de base que nos dê estabilidade".

Instalações junto ao Taguspark

O centro de investigação da Católica ficará instalado junto ao Taguspark, no concelho de Sintra, no quarto e último piso do edifício da antiga Faculdade de Engenharia, encerrada em 2013 por razões de ordem financeira. São 1000 m2 de espaço para laboratórios e os outros três pisos estão reservados para a Faculdade de Medicina. As infraestruturas previstas para o instituto biomédico incluem um Biotério, um Biobanco (banco de materiais biológicos), equipamentos de imagiologia (microscópios eletrónicos, processamento de imagem) e citometria de fluxo, isto é, capacidade para separar e analisar populações celulares.

"A prioridade inicial será desenvolver as plataformas tecnológicas necessárias ao funcionamento destas infraestruturas e contratar os melhores especialistas para esse efeito", conta Pedro Simas. "E tenho garantido espaço para dez grupos de investigação". Quanto ao financiamento das infraestruturas, "queremos atrair como parceiros os fabricantes de instrumentos", como é prática comum noutros centros de investigação em todo o mundo.

"Mesmo assim não partimos do zero, porque a Universidade Católica já possui uma base muito sólida na investigação nas ciências da vida", recorda: o Centro de Biotecnologia e Química Fina (CBQF), que teve a classificação de "Excelente" na última avaliação dos centros de investigação nacionais promovida pela FCT; e o Centro de Investigação Interdisciplinar em Saúde (CIIS), que teve a classificação de "Muito Bom" no mesmo processo de avaliação.

Pedro Simas, 54 anos, é médico veterinário e fez o doutoramento em virologia na Universidade de Cambridge (Reino Unido), onde trabalhou com uma bolsa da fundação Wellcome Trust, uma das maiores instituições de apoio à ciência do mundo. No regresso a Portugal passou pelo Instituto Gulbenkian de Ciência e está no iMM desde a sua fundação, há 15 anos, onde é líder do Grupo de Patogénese Viral e coordenador científico do Biotério. O Biotério é um local onde são criados e conservados animais usados em experiências científicas.

ExpressoVirgílio Azevedo - 05.09.2019