Laboratórios do Estado: investigadores precários à espera de novo parecer para serem integrados

O Governo criou uma comissão para decidir se os investigadores a trabalhar com vínculos precários nos laboratórios do Estado entram na carreira técnica superior ou de investigação científica. Parecer será vinculativo.

Os investigadores precários a trabalhar nos laboratórios do Estado terão de esperar mais dois meses, pelo menos, até verem a sua situação laboral resolvida. O atraso deve-se ao facto de o Governo ter criado uma comissão de peritos para decidir em que carreira estes trabalhadores devem ser integrados: se na técnica superior ou de investigação científica.

O despacho a criar a nova comissão foi publicado a 22 de Agosto e vai adiar a integração de vários investigadores que passaram todas as fases do Programa de Regularização Extraordinária de Vínculos Precários da Administração Pública (PREVPAP) e esperavam entrar no quadro o mais brevemente possível. 

Em causa estão várias dezenas de investigadores do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), do Laboratório Nacional de Engenharia Civil, do Laboratório Nacional de Geologia, do Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária e do Instituto Ricardo Jorge. 

A situação foi denunciada pelo núcleo de precários do IPMA, que tem 38 investigadores nessa situação e que questionam a necessidade de uma nova comissão. Bárbara Pereira, bolseira doutorada há oito anos, considera que “o mais grave” é que o próprio presidente do IPMA atestou, durante o processo do PREVPAP, que “as funções dos trabalhadores em causa correspondiam a actividades de investigação e a necessidades permanentes deste serviço, pelo que deveriam ser integrados na carreira de investigação científica”. “Tínhamos a expectativa de que seríamos integrados como investigadores auxiliares”, acrescenta em declarações ao PÚBLICO.

O IPMA já regularizou a situação de 84 trabalhadores, dos quais 69 entraram na carreira técnica superior e 15 na de assistente técnico ou operacional, e o problema coloca-se apenas com os investigadores doutorados.

Questionado pelo PÚBLICO sobre as razões que levaram a este despacho, fonte oficial do Ministério das Finanças (responsável, juntamente com o Ministério do Trabalho, pelo PREVPAP) explicou que no caso dos laboratórios do Estado “foi constatado que as funções exercidas por alguns trabalhadores podem não ter coincidência com a designação formal dos respectivos contratos”.

Ou seja, acrescenta, alguns destes trabalhadores exercem funções correspondentes a carreiras gerais, nomeadamente a carreira técnica superior, ou a carreiras especiais, nomeadamente a carreira de investigação científica. Além disso, há trabalhadores com grau de doutor, necessário para a integração na carreira de investigação científica, e exercem funções com base em contrato de trabalho a termo resolutivo, como investigadores convidados, ou em bolsas de investigação, nomeadamente de pós-doutoramento.

Perante esta realidade, o Governo considera que é necessário “fazer a destrinça das funções efectivamente realizadas pelos trabalhadores a integrar e perceber a carreira em que os mesmos devem ser integrados, tendo de ser analisado se se encontram reunidos os requisitos para integração na carreira de investigador, o que, por vezes, pode ser complexo”.

A comissão de peritos agora criada vai prestar assessoria qualificada aos dirigentes dos laboratórios do Estado e visa assegurar “igualdade de tratamento dos trabalhadores em causa”. O parecer final será “vinculativo”, confirmou o Ministério das Finanças, sem se comprometer com uma data para a abertura dos concursos. Os procedimentos concursais, respondeu apenas, serão abertos “logo que a comissão se pronuncie”.

O PÚBLICO procurou saber quantos trabalhadores estão em causa além dos 38 do IPMA, mas o Ministério das Finanças não esclareceu. Contudo, no final de Julho, quando o PCP questionou o Governo sobre esta matéria, citando dados de uma carta aberta que os trabalhadores enviaram ao grupo parlamentar comunista, citou “111 pareceres favoráveis a aguardar homologação” no LNEC, “26 precários no Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge, 34 no Instituto Português do Mar e da Atmosfera, 15 no Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária, 15 no Laboratório Nacional de Energia e Geologia”. Um total de 201 pessoas.   

O acesso ao PREVPAP foi feito mediante a avaliação do caso de cada trabalhador por parte das comissões de avaliação bipartida (CAB), nas quais têm assento representantes dos ministérios, dos organismos públicos com precários e dos sindicatos, que confirmaram se as pessoas exerciam funções permanentes sem vínculo adequado. Porém, como esclarecem as Finanças, não constituía função das CAB definir qual a carreira para a qual o respectivo procedimento concursal deve ser aberto, sendo essa matéria da competência dos dirigentes máximos dos serviços.

No preâmbulo do despacho, o Governo reconhece que a “competência” e “responsabilidade” dos dirigentes será respeitada, mas também considera “conveniente proporcionar-lhes assessoria qualificada que ao mesmo tempo assegure imparcialidade e igualdade de tratamento de quem, em função das funções exercidas, deva ser integrado na carreira de investigação científica ou na carreira técnica superior”.

A comissão será constituída por três a cinco especialistas independentes, dois deles permanentes a indicar pelo presidente do respectivo laboratório de Estado, e, pelo menos, um deles da área científica de cada laboratório a designar pelos membros permanentes. Os especialistas não podem ter exercido funções nos últimos cinco anos nos laboratórios que estejam a ser analisados. 

Raquel Martins - 5 de Setembro de 2019, Público