Governo quer criar condições “para que os jovens tenham capacidade de ter filhos mais cedo”

As baixas para assistência a filho, em caso de doença ou acidente, passarão a ser pagas a 100%.

A ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Ana Mendes Godinho, diz que o Governo tem 1524 milhões de euros destinados a apoiar a natalidade. Garantindo que o cheque para ajudar a pagar a creche vai chegar às famílias no último trimestre de 2020, avança que as baixas para assistência a filho, em caso de doença ou acidente, passarão a ser pagas a 100%.

As baixas para assistência a filho em caso de doença ou acidente vão passar a ser pagas a 100%, quando entrar em vigor o novo Orçamento de Estado. E, a partir do último trimestre de 2020, todas as famílias com um segundo ou mais filhos até aos três anos de idade vão ter direito a um cheque para ajudar a custear a factura da creche.

O montante ainda está por definir, mas a ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Ana Mendes Godinho, assegura que todas as famílias terão direito, independentemente dos rendimentos. Passando em revista as medidas previstas para apoiar a natalidade e a parentalidade, a governante adianta que o país deverá ver criados 4500 novos lugares em creche, nomeadamente no Porto, Lisboa e Setúbal. 

No somatório das medidas de apoio à natalidade, que aposta na capacitação dos jovens para terem filhos, nomeadamente com a isenção fiscal parcial de 30% no primeiro ano de entrada no mercado laboral, o Governo propõe-se investir 1524 milhões de euros.

Quando e em que moldes vai funcionar o complemento-creche previsto na proposta de Orçamento de Estado para 2020, cuja dotação ascende aos 30 milhões de euros?
Estamos neste momento a preparar a regulamentação para o complemento-creche. O objectivo é que entre em vigor já no ano lectivo 2020-2021, portanto, no último trimestre de 2020, e o princípio é criar uma prestação universal para todas as famílias, independentemente do rendimento. Neste momento, ainda não conseguimos avançar um valor em concreto do montante a atribuir a cada família, porque estamos a desenhar o modelo. Mas será um complemento destinado a todos os segundos e mais filhos que as famílias poderão utilizar em qualquer estabelecimento creche.

Quem tenha um primeiro filho não terá direito a este complemento?
É para segundos filhos e mais. Será uma prestação pecuniária que o Governo atribuirá aos pais por cada criança, a partir do segundo filho, que esteja a frequentar uma creche.

É possível ter já uma ideia, ainda que aproximada, do valor?
Não conseguimos determinar ainda os valores. É esse exercício que estamos a fazer neste momento, sendo que há uma dotação já prevista, com base em algumas simulações, mas os valores exactos não é possível ainda adiantar.

E isto será atribuído a pais de dois ou mais filhos em idade de frequentar uma creche, independentemente de a frequentarem ou não?
Não. O objectivo é que seja para todas as crianças que frequentem creches. O direito a este complemento suporá que os pais utilizem a creche, pública ou privada.

Que outras medidas se prevêem nesta lógica de apoio à natalidade?
Se compararmos com 2014, os últimos indicadores da natalidade apontam para um aumento de 4264 crianças, o que mostra também uma recuperação da capacidade de os jovens terem filhos. Uma das nossas preocupações, dentro do desafio demográfico que assumimos no programa de Governo, é criarmos as condições para que os jovens se autonomizem e tenham capacidade de ter filhos mais cedo, o que implica valorizar e aumentar os seus rendimentos.

E, além destes instrumentos, vamos apostar nos apoios sociais directos à natalidade e à parentalidade. Aliás, na proposta de Orçamento de Estado para 2020 temos previstos 1524 milhões de euros nestas medidas de apoio à natalidade e à parentalidade.

Em 2015, para as mesmas medidas, tínhamos mil milhões de euros. São mais 500 milhões de euros para os instrumentos de apoio à natalidade, concretamente para as licenças de parentalidade e para o abono de família, com a concretização plena do quarto escalão e o alargamento da abrangência das crianças dos 12 para os 36 meses. Isto reflecte um impacto financeiro de 37 milhões de euros a mais, ou seja, de acréscimo. Quanto às licenças, teremos o alargamento da licença obrigatória por parte do pai a seguir ao nascimento que passa para 20 dias úteis.

Estas medidas deverão vigorar a partir de quando?
A partir da entrada em vigor do Orçamento do Estado. O mesmo se poderá dizer do aumento da licença para assistência a filhos com deficiência ou doença crónica, que passa a ser estendida às doenças oncológicas e que passa a ser prorrogável até ao limite máximo de seis anos, com direito a um subsídio igual a 65% da remuneração de referência do beneficiário.

Somados, o aumento da licença obrigatória do pai para 20 dias úteis e o aumento do subsídio por riscos específicos e de acompanhamento a filhos, representam um acréscimo de 69 milhões de euros face a 2019. O que significa se comparar com 2015 um aumento de 54%. Por outro lado, o subsídio nas faltas para assistência a filho, em caso de doença ou acidente, passa de 65% para 100% da remuneração de referência.

E vamos ter o aumento da dedução à colecta dos filhos a partir do segundo filho que é também uma medida fiscal. Basicamente, o que estamos a procurar é ter medidas integradas e articuladas que garantam respostas aos diferentes níveis de rendimento das famílias.

Parece haver aqui uma clara aposta no segundo filho ou subsequentes.
No fundo, o que queremos é um aumento do número de filhos por família. E depois também que os jovens atinjam a sua autonomização e independência e a capacidade de terem filhos que é o que se procura com esta aposta na valorização dos rendimentos dos jovens, quer através da isenção parcial fiscal de 30% no primeiro ano de entrada no mercado laboral quer através de medidas combinadas, nomeadamente aquelas que estamos a negociar em sede de concertação social.

Isto para responder aos dois principais problemas da demografia portuguesa: por um lado, o adiamento da idade em que se tem o primeiro filho, e, por outro, as dificuldades de transição para o segundo ou mais filhos?
O principal objectivo é, por um lado, garantir condições que tornem o país atractivo para os jovens, porque é fundamental termos jovens para que a natalidade aumente, e, por outro, dar-lhes mais capacidade para terem filhos. Isto sem esquecer o reforço dos apoios sociais às famílias e das condições de exercício dos direitos de acompanhamento dos filhos por parte dos pais. Insere-se nesta preocupação a medida do alargamento da licença obrigatória do pai para 20 dias úteis.

Os diferentes estudos insistem na ideia de que o mercado de trabalho português continua muito hostil relativamente a esta necessidade de conciliação da vida familiar com os encargos profissionais.
O “Programa 3 em linha” [lançado no final de 2018 e que prevê 33 medidas para a conciliação da vida profissional, pessoal e familiar] já veio na sequência desta identificação da necessidade de nos mobilizarmos para garantir uma melhor conciliação, nomeadamente com o referido reforço da licença obrigatória do pai e, por exemplo, com a possibilidade de os pais terem uma dispensa de três horas no primeiro dia de aulas dos filhos.

A par disto, estamos a negociar com os parceiros sociais, em sede de concertação social, a implementação de medidas que procuram que essa conciliação seja cada vez mais eficaz. E continuamos a trabalhar na promoção da igualdade de género no mercado de trabalho, através de mecanismos de monitorização e garantindo a existência de indicadores que vão ser públicos para que as empresas consigam elas próprias avaliar o equilíbrio da presença de homens e mulheres no mercado de trabalho, nomeadamente quanto aos salários.

Os imigrantes também hão-de ter um papel importante no tocante à natalidade.
O terceiro nível de actuação relativamente ao desafio demográfico incide precisamente na preocupação em criar condições para atrairmos estrangeiros para Portugal, nesta lógica de país aberto que acolhe estrangeiros. E, neste momento, posso-lhe adiantar que, menos de um mês depois do lançamento do programa destinado a simplificar a vida aos estrangeiros que queiram trabalhar e viver em Portugal, já temos mais de dez mil números de Segurança Social atribuídos na hora.

É uma coisa extraordinária que mostra que estamos a criar formas de simplificação da vida dos estrangeiros, dentro dessa preocupação com o saldo migratório e da procura de termos pessoas em idade activa em Portugal.

E em relação aos equipamentos sociais, nomeadamente ao prometido reforço do número de lugares nas creches?
Eles são fundamentais para permitir esta conciliação entre a vida pessoal e familiar e a vida profissional e, em 2020, prevemos um orçamento dedicado à Segurança Social superior a dois mil milhões de euros, o que inclui o alargamento da rede de equipamentos sociais de apoio às famílias.

Quanto às creches, no âmbito do aviso de abertura de candidaturas ao PARES [Programa de Alargamento da Rede de Equipamentos Sociais], que termina no final deste mês, e que foi lançado para responder àqueles concelhos que tinham uma taxa de cobertura inferior a 33%, como Lisboa, Porto e Setúbal, entre outros, já temos 87 candidaturas com uma previsão de 4500 novos lugares de creche. E estamos ainda a receber candidaturas.

Além disso, prevemos no Orçamento para 2020 abrir ainda mais “avisos” para alargar os lugares de creche em todo o país, a par dos equipamentos de resposta a pessoas idosas e com deficiência.

Natália Faria  - 21 de Janeiro de 2020, Público