Provedora de Justiça Governo recusa mudar IRS para salários pagos com atraso

Contribuintes são confrontados com IRS superior ao que deveriam pagar se tivessem recebido o salário de forma regular. Provedora de Justiça pediu alteração, mas Governo recusou.

Maria Lúcia Amaral, provedora de Justiça, critica situação de "profunda e incompreensível injustiça fiscal"

O Governo não está disponível para corrigir a forma como os rendimentos relativos a salários pagos com atraso são tributados em sede de IRS, o que leva a que os contribuintes paguem mais IRS do que se esses salários lhes tivessem sido pagos na altura devida. A recomendação foi feita pela provedora de Justiça, Maria Lúcia Amaral, na tentativa de resolver uma situação que se arrasta há duas décadas, noticia o Negócios.

Para o cálculo do IRS, as Finanças somam o rendimento auferido nesse ano aos rendimentos de anos anteriores (relativos ao pagamento de salários em atraso, recálculo de pensões ou a indemnizações por despedimento ilegal), empurrando o IRS desses contribuintes para escalões superiores.

O resultado é que o contribuinte paga mais imposto do que deveria pagar se os rendimentos em causa tivessem sido pagos nos anos devidos.

A provedora de Justiça considera que este regime de tributação cria “situações de profunda e incompreensível injustiça fiscal”, em particular no caso dos contribuintes que, “sem culpa”, enfrentam anos de atrasos em pagamentos e que “depois são duplamente penalizados com uma tributação agravada e até com a perda de benefícios sociais”.

Perante isto, Maria Lúcia Amaral escrever ao ministro das Finanças, Mário Centeno, a recomendar alterações legislativas para “repor a justiça” e pagar retroactivos a quem tenha sido prejudicado pelo regime.

A resposta que chegou do Terreiro do Paço ignora a recomendação e o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, António Mendonça Mendes, nota que a forma de tributar esses rendimentos tem sido alterada ao longo dos anos e justifica-se com a falta de meios e de capacidade técnica do Estado.

“Não se mostra actualmente oportuna a introdução ode uma alteração”, acrescenta.

Não é a primeira vez que a Provedoria se pronuncia sobre este tema. A primeira vez foi em 2008 e já então o Governo de José Sócrates não acatou a recomendação para alterar o regime.

Em 2014, na reforma do IRS, o regime teve uma alteração que permite dividir o rendimento pelo número de anos a que dizem respeito, atenuando o impacto negativo. Mas, ainda assim, a Provedoria de Justiça recebeu 23 queixas de pessoas que se sentiram lesadas.

“Estas alterações, até mesmo a última, tiveram por consequência amortecer, mas nunca eliminar, a injustiça fiscal gerada pelo regime jurídico da tributação de rendimentos gerados em anos anteriores”, afirma a actual provedora no parecer citado pelo Negócios.

Raquel Martins - 10 de Dezembro de 2018, Público