Salários aceleram, mas função pública continua a perder poder de compra

A remuneração total média por trabalhador aumentou 7,4% no primeiro trimestre do ano. Mas enquanto no sector privado houve um ganho real de 0,3%, na função pública o poder de compra recuou 2,5%.

A remuneração bruta total média acelerou no primeiro trimestre do ano, mas o aumento de 7,4% não se traduziu em ganhos do poder de compra para todos. Apenas os salários do sector privado registaram aumentos reais de 0,3%, enquanto na função pública os trabalhadores tiveram uma perda do poder de compra de 2,5%.

De acordo com os dados divulgados nesta quinta-feira pelo Instituto Nacional de Estatística, com base na informação relativa a 4,5 milhões de beneficiários da Segurança Social e da Caixa Geral de Aposentações, a remuneração bruta total mensal média por trabalhador (que inclui subsídios de férias e de Natal) passou de 1262 euros, no primeiro trimestre de 2022, para 1355 euros, no arranque de 2023. Trata-se de um aumento de 7,4%, superior à subida de 4,5% registada no trimestre anterior.

Em termos globais, e tendo em conta que a inflação foi de 8% no primeiro trimestre, esse aumento de 7,4% traduziu-se numa perda de poder de compra de 0,6%.

Em termos gerais, esta perda de poder de compra representa um abrandamento face ao que se verificou em Março de 2022, quando os salários reais caíram 1,7%, e no final do ano passado, quando a queda foi de 4,9%.

Contudo, no primeiro trimestre de 2023, esse efeito não atingiu de igual forma os trabalhadores. Enquanto no sector privado se assistiu a um ganho de poder de compra, embora ligeiro, na função pública a perda foi superior à média.

No sector das Administrações Públicas observou-se um acréscimo homólogo de 5,4% na remuneração total, que atingiu 1765 euros em Março de 2023 (valor que compara com os 1676 euros do período homólogo de 2022). Contudo, esse aumento traduziu-se numa queda de 2,5% do salário real.

Os dados agora conhecidos mostram que os aumentos na função pública não foram suficientes para estancar a perda a que se assiste desde o segundo trimestre de 2021. Ainda assim, a perda real dos salários de 2,5% é inferior à registada no período homólogo (-2,9%) e no último trimestre de 2022 (-6,2%).

No sector privado – embora o nível salarial seja mais baixo – os salários aumentaram de forma mais expressiva, com a remuneração total a registar uma variação homóloga de 8,3% (passando de 1176 euros em Março de 2022 para 1274 euros um ano depois). Neste sector, sublinha o INE, foram observados aumentos homólogos reais de 0,3%.

É a primeira vez que as remunerações do sector privado têm um ganho real desde o terceiro trimestre de 2021 (quando o ganho foi de 0,6%).

Na comparação com Março de 2022, os maiores aumentos da remuneração bruta total mensal média foram observados nas “actividades dos organismos internacionais e outras instituições extraterritoriais” (13,2%), nas empresas com um a quatro trabalhadores (8,6%) e nas empresas de “serviços de mercado com forte intensidade de conhecimento” (10,5%).

Não foram observadas variações negativas da remuneração bruta total mensal média, tendo as menores variações homólogas sido observadas nas actividades de “Administração Pública e Defesa e Segurança Social Obrigatória” (3,6%), nas empresas com 250 a 499 trabalhadores (4,4%), no sector das Administrações Públicas (5,4%) e nas empresas de “serviços financeiros com forte intensidade de conhecimento” (4,2%).

Em termos reais, os ganhos mais significativos ocorreram nas "actividades dos organismos internacionais e outras instituições extraterritoriais” (4,8%) e na "electricidade, gás e água" (3,9%).

As actividades que tiveram maiores perdas de poder de compra foram a "Administração Pública e Defesa e Segurança Social Obrigatória” (-4,1%), as "actividades financeiras e de seguros" (-3,6%) e a agricultura (-3%).

Vários factores terão contribuído para que os salários tenham acelerado no início de 2023. Desde logo, o aumento do salário mínimo em 7,8% (de 705 para 760 euros brutos mensais) e a actualização dos salários da função pública que oscilou entre 2% para os salários mais altos e os 8% para quem está na base da tabela remuneratória única e foi maior do que em 2022.

No caso dos mais 742 mil trabalhadores da função pública, O Governo anunciou também um aumento extraordinário de 1% a partir de Maio, mas com efeitos retroactivos a Janeiro.

A falta de mão-de-obra em determinados sectores e o acordo de rendimentos (que pressupõe um aumento médio dos salários de 5,1% na contratação colectiva em 2023) também podem estar a pressionar a subida das remunerações

Raquel Martins - 11 de Maio de 2023, Público